quinta-feira, agosto 30, 2007

 

Os ases do voo

Esta manhã a equipe do Red Bull Air Race fez as suas acrobacias mesmo junto às águas do Douro. Em cada passagem de um avião, sentia-se a emoção do risco e do espectáculo. Mas a rotina e a aproximação do almoço começaram a criar um sentimento de saturação. Nesta altura, veio-me à imaginação um instinto malvado e sádico de esperar que algo, um frémito de emoção (sem se aleijarem, naturalmente!) me arrebatasse. Ao dar conta da perversidade destas cogitações íntimas, desabafei com os meus botões: «primo, afinal tu não és tão boa pessoa como te julgas, não passas de um dos muitos filhos da mãe que por aí andam esquecidos, tens em ti a maldade de que falou Hobbes e não o bom coração apregoado por Rousseau».

E enquanto este diálogo decorria, no segredo da minha consciência, reparei num grupo de velhinhos de um lar da Ribeira colocados mesmo na frente das grades que nos separavam do Rio, indiferentes às acrobacias e barulho dos aviões, dormitando com a cabeça virada para o chão e o olhar recolhido nas asas do infinito.

Descobri que tenho de esperar mais algum tempo para ser possuído pela experiência sábia da vetusta idade: saber que a felicidade só se conquista com a indiferença pelo efémero.

quarta-feira, agosto 29, 2007

 

Red Bull Air Race

Hoje, de tarde, a Ribeira do Porto estava repleta de gente que aguardava os aviões da “fórmula 1 dos ares”.
Mas o Rio Douro continuou indiferente à Red Bull Air Race que se realizará no Sábado e quem quis ver as acrobacias dos aviões teve de olhar para muito alto.
Amanhã, dizem-me que os treinos já serão junto ao Rio.
Lá estarei para ver!

terça-feira, agosto 28, 2007

 

El viento calígrafo

pincel en mano el viento dibuja paisajes de
palabras
montañas esculpidas
llanuras de sombras
enclaves de horizontes
el calígrafo cosquillea
los surcos inflamados del desierto
con un bastoncillo de tinta delicada

Abdourahman A. Waberi
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Enviado por Amélia Pais

segunda-feira, agosto 27, 2007

 

Um símbolo, sinal dos tempos.

D. João Peculiar, arcebispo que coroou D. Afonso Henriques, foi esculpido com um báculo que lembra um pénis. Esta escultura é um sinal dos tempos, harmoniza-se com a pos-modernidade e está-se a tornar num cartão de visita da Cidade dos Arcebispos. E, com alguma razão, já há quem pense que Braga entrou numa concorrência desleal com Caldas da Rainha.

Penso que as conotações monárquicas entre D. Afonso Henriques e a Rainha deveriam ser aprofundadas para colmatar as falhas do ensino de História, em Portugal.

Lembremo-nos, por exemplo, dos contributos que arqueólogos e antropólogos deram à compreensão da história dos povos primitivos com a descoberta de imensos falos entre as ruínas das antigas civilizações maia e azteca, no México, na América Central e América do Sul e, mais recentemente, na Europa e Ásia. A queda de tais civilizações ficou explicada!

O báculo (ou, já que traz um perservativo na ponta, "o fálaco") do Arcebispo pode e deve tornar-se no símbolo peculiar do amor que levou à fundação de Portugal e na senha que nos ajuda a compreender o desígnio que Sócrates encontrou
para as premonitórias palavras de Fernando Pessoa: "Falta cumprir-se Portugal!".

domingo, agosto 26, 2007

 
Escutai o mar
O mar geme ao longe e grita na solidão
A minha voz fiel como a sombra
Quer ser finalmente a sombra da vida
Quer ser, ó mar vivo, infiel como tu.

Guillaume Apollinaire

Enviado por Amélia Pais

sábado, agosto 25, 2007

 

Eduardo Prado Coelho deixou-nos!

Conheci o professor e ensaísta Eduardo Prado Coelho há muitos anos. Tinha por ele grande simpatia e consideração. Chegou, numa das suas crónicas, a referir um texto que escrevi no JN. Foi pelos seus escritos que despertei para o estruturalismo. A última obra que li dele, um pouco à pressa - devo reconhecer – foi "Diálogos sobre a Fé" que escreveu com D. José Policarpo.

Eduardo Prado Coelho faz-nos falta: estava acima da vulgaridade pesporrente que por aí campeia!

Sabia que estava doente, mas não esperava que nos deixasse tão depressa.
Onde estiver, Professor, receba o meu abraço.

sexta-feira, agosto 24, 2007

 

“Felizmente, há luar!...”, como diria Sttau Monteiro.

Felizmente já me retiraram os pontos que apertavam as fissuras deixadas pelos oito ou nove pólipos que tinha nos olhos. Devo confessar que estava cheio de “caguefes”.

Depois de vestir o fato branco, colocar o saco verde de plástico nos pés e me sentar na cadeirinha de rodas que me levou à sala da cirurgia, senti-me no papel daquele político que, em campanhas eleitorais, movimenta o olhar numa incansável e ávida busca de encontrar uma qualquer figura importante que lhe manifeste apoio. A única diferença estava no meu ar de assustado. Por experiência própria, tinha consciência de que os clientes da ADSE eram tratados à peça: quanto mais depressa despachados, mais se cobrava.

Não me importava que os pequenos quistos fossem arrancados com a mesma velocidade com que Sócrates fez desaparecer as referências que lembravam a sua engenharia em A4, mas queria que me fosse garantido poder continuar naquela postura clássica de só utilizar dois olhos únicos para, como diria Leonardo da Vinci, abrir os caminhos da beleza do mundo. Nunca apreciei o transgenitismo pos-moderno que aproveita mais que dois!...

Mal vi o médico, comuniquei-lhe as minhas preocupações. Felizmente, o jovem clinico, Manuel Domingos, estava distanciado do paradigma socratenho dos cuidados médicos à peça e soube ouvir e tratar-me com paciência, profissionalismo e simpatia. Quando for à Clipóvoa não quero outro médico!

Deitado na mesa da cirurgia, segui, então, a estratégia com que as balzaquianas, mesmo a revirar os olhos, conseguem resfriar os ímpetos mais escaldantes. E, enquanto o anestésico ia adormecendo os meus olhos, resolvi discursar: explanei, num exaltante solilóquio, as provas da existência de Deus aventadas por Tomás de Aquino e a elas contrapus a minha refutação com o argumento de que um ser perfeito se avalia pela sua obra e o facto de estar ali, sujeito à correcção de imperfeições, mostrava à evidência que o Teólogo não tinha razão.

Pressentia que o médico e as enfermeiras que o serviam nada queriam saber da tese que em voz alta desenvolvia, mas isso também pouco me preocupava. O que me convinha era dobrar o meu pensamento para um lado diferente daquele em que sentia os aparelhos a arrancarem os quistos que me prostravam naquele estado. E esse lado ficava no ouvir o meu verbo. Enquanto ouvia o meu discurso, esquecia os receios e sentia-me mais seguro em recuperar a capacidade de aprimorar as percepções que a vida, as pessoas e o mundo me proporcionam.

Uff!!!... foi a expressão que me saiu, logo que a venda me foi retirada. E ao limparem-me as vistas vi, como terá acontecido na aparição aos pastorinhos de Fátima, uns olhos lindíssimos de uma jovem enfermeira a olhar para dentro dos meus. Foi o restabelecimento duma doçura de repouso deslumbrante que voluptuosamente percepcionava há uns bons anos atrás!...

Só por isto valeu a pena a cirurgia!....

quinta-feira, agosto 16, 2007

 

Intervalo

Amanhã vou fazer uma pequena cirurgia para retirar uns quistos que me apareceram nos olhos. A intervenção será feita numa daquelas clínicas com acordos com a ADSE, onde os médicos recebem à peça. Terá de ser rápida, mas espero que não me traga problemas.

Talvez não possa escrever durante algum tempo.

Até ao meu regresso!

 

Elvis Presley

Elvis Presley deixou-nos há 30 anos. Diz-se que afirmou um dia que a sua vida só fazia sentido a cantar. Talvez se deva a esta obsessão a sua morte prematura.

Nunca fui roqueiro, mas gostava de ouvir "suspicious mind" e "always on my mind": aproximam-se do tom das baladas e foram sobretudo estas que marcaram a minha adolescência.

Devo, no entanto, reconhecer que Elvis foi um dos maiores ícones da música popular do século passado. Por todo o mundo há clubes de fãs que o imitam e adquirem tudo o que tenha a ver com o Rei do Rock. Portugal não foge à regra.

Deixo-lhe aqui a minha homenagem.

http://www.youtube.com/watch?v=FImwVKsBfEM
http://www.youtube.com/watch?v=VI94AsuvUUA&mode=related&search=
E já, agora, ouçam, só mais esta maravilha:
http://www.youtube.com/watch?v=V8R_y6B2vr0&mode=related&search=

quarta-feira, agosto 15, 2007

 

Apontamento de circunstância

Goebbels ficou conhecido pela frase: «sinto vontade de sacar o revólver, sempre que ouço falar em cultura».

Este desconforto nada tem a ver com a barbárie: apenas ilustra de forma muito clara a circunstância de quem obriga a cultura a dobrar-se ao poder para perder o sentido libertador que estava na sua génese. E é isto que parece estar a acontecer com o tempo em que vivemos, o tempo pós-moderno deste poder “socratino”.

Na tradição moderna, na qual se configurou o socialismo, o poder servia a emancipação do homem e era inseparável duma cultura aliada à moral na promoção dos fins libertadores da razão. “Sapere aude!” Ousa servir-te da razão, diria Kant.

A pós-modernidade substitui os princípios universais da razão pelos jogos da simulação retórica e transforma a cultura num adereço subordinado á vida pulsional. É, assim, que, por exemplo, vemos o discurso a ser conjugado na primeira pessoa ou nos imperativos pessoais (eu fiz…, isto é assim!..). Desprezam-se as referências do passado, substitui-se o livro pelos jogos de vídeo e coloca-se a acção política na omnipresença do simulacro, no marketing, no espectáculo, nos interesses segmentários.

Neste contexto, só inadvertidamente nos podemos escandalizar com o facto deste socratino Governo levar aos ombros Berardo até ao Centro Cultural de Belém, ajudando as suas acções a subirem na bolsa, e desprezar o centenário de Miguel Torga, o que este escritor, dramaturgo, ensaísta e poeta, significa na capacidade de dar voz à Terra, ao País e ao sofrimento dos que mais sofrem.

Este Governo é pós-moderno, está mais próximo de Goebbels que de Miguel Torga.

 

Viva Alcochete!

No regresso do Algarve, passei por Alcochete e fiquei com vontade de lá ficar.

O nome de Alcochete parece dever-se aos árabes, mas quem marcou esta Vila, lhe deu a Carta de Foral, foi, como se sabe, D. Manuel I, que aqui nasceu em 1515.

As Festas do Barrete Verde são em honra de Nossa Senhora da Vida e de homenagem ao Salineiro, ao Forcado e ao Campino. De facto, a vida vive-se, sabendo enfrentar riscos; e, ao ser-se bem sucedido nesse exercício, tem-se razões para fazer festa. É isso que é glorificado pelos alcochetenses.

Fiz com um mar de gente a festa: ouvi os fados, assisti à largada dos touros e participei na sardinhada. É indescritível a loucura que se vive com as largadas dos touros. São velhos, novos e crianças a desafiarem um, dois, três monstros pretos, de meia tonelada e de cornos em riste. Por volta da meia-noite, houve a sardinhada: à porta de suas casas, com o barrete verde na cabeça, inúmeros alcochetenses assavam para quem passava sardinhas, que eram gratuitamente servidas com pão e vinho à discrição.

Percebi, então, o que dizia Ortega Y Gasset, sobre a relação entre a fúria do touro e a arte de a vencer. No seu entender, domar a fúria do animal é também uma forma de humanizar.


Na verdade é isso que as pinturas rupestres e também as de Goya, Velásquez, Picasso e outras tão bem glorificaram. E é isso que comemoram os alcochetenses com sardinhas, touros e fados.

Alcochete é uma Terra que preserva as suas raízes. Por isso, tem uma identidade, é hospitaleira, fraterna, simpática e festiva.

Viva Alcochete!

terça-feira, agosto 14, 2007

 

Férias em Lagos

Durante muitos anos pensei que Lagos resistiria à voragem dos “patos bravos” que enxameiam o Algarve de mamarrachos. Mas ao olhar para o Castelo de Lagos senti o aperto de alma que, em 1755, D. José I terá sentido ao ter conhecimento das malfeitorias deixadas pelo tsunami gerado pelo Terramoto.

Desapareceu o parque de campismo que deveria tornar-se num espaço verde a enaltecer a imponência das muralhas do Castelo. Sumiu-se o Castelo e as suas muralhas seguram arrogantes e pacóvios mamarrachos.


Pobres lacobricenses que lhes vão ceifando a memória, em nome de um poder que os ilude com um "progresso" traiçoeiro!!!

A Cidade já não lhes deixa ver as mãos que, tremulamente, se erguiam nas ameias do Castelo para acenar adeuses às naus que partiam em direcção às conquistas em Marrocos e à descoberta das costas ocidentais de Africa; já não lhes deixa ouvir os soluços repetidos das damas que assomavam às torres procurando num infinito mar de desespero o Rei ausente.

Lagos já não é lacobriga dos celtas, porto para fenícios, gregos e cartagineses, cidade cobiçada por árabes e romanos, mercado de escravos, centro do comércio dos produtos exóticos, do marfim, do ouro e da prata de África, residência do navegadores, sede de bispado, casa de D. Sebastião, palácio de governadores, centro da industria de conservas de peixe, orgulho do nosso passado.

Lagos vai perdendo a sua luz para ficar entalada no cinzento dos taipais. Já não responde ao passado de todos nós, não fala da nossa identidade colectiva, não é a história de um espírito de vida em comum, a Cidade do esplendor da harmonia entre o mar, o sonho, a luz, a vida, a saudade, o amor, a natureza e o mundo que Sophia de Mello Breyner tão bem interpretava.

Lagos tornou-se mais uma das cidades do Algarve.

Pobre País que te abandonou!

quarta-feira, agosto 01, 2007

 

Num pequeno intervalo de férias…

O PS e o governo estão satisfeitos com o despacho do Ministério Público de arquivamento do inquérito à licenciatura do Primeiro-ministro. E argumentam que foi uma calúnia o ter sido posta em causa a engenharia de Sócrates.

Mas será que é normal e prestigiante um estudante de engenharia fazer exames por fax e numa folha A4 e ter as facilidades que teve José Sócrates?!...

Naturalmente, tudo isso pode não ser ilegal, mas é pouco decente. Nem sempre o que não é ilegal não é obsceno.

Mas, pensando bem, para um PS desbotado (mais post srciptum) e para um primeiro ministro que faz do exercício da político um espectáculo de mau gosto, uma licenciatura de aviário, mesmo contaminada pela gripe das aves (na Independente), será sempre, como dizem os brasileiros, legal!...

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